OS REGIMES DE SEPARAÇÃO DE BENS NO MATRIMÔNIO E A PROTEÇÃO PATRIMONIAL EM CASO DE DIVÓRCIO OU SEPARAÇÃO
Com a mudança da sociedade e, por consequência, de seus costumes, as famílias foram encontrando novas formas de constituição. A exemplo desta alteração está a (contestada) existência de entidade familiar por apenas uma pessoa, havendo muitas controvérsias por parte da doutrina e da jurisprudência atual acerca do tema, porém evidenciando a mutabilidade às vezes imperceptível dos seres humanos em conjuto.
Em relação às pessoas que possuem o interesse em constituir família através da celebração de sua união pela via legal, tal mudança também acompanhada os novos cenários montados aos palcos da vida cotidiana. A exemplo disto está o casamento hoje permitido entre pessoas do mesmo sexo, advindo de Resolução emitida pelo Conselho Nacional de Justiça [1]. Pensando-se nas relações existentes há pouco mais de 60 anos, esta união não somente seria reprovada pela sociedade como ilegal e punível em alguns países.
Entretanto, ainda que latentes as mudanças na sociedade, a formalização da união tida como mais tradicional ainda é o casamento civil. Embora o número de uniões deste tipo tenha caído nos últimos vinte anos de forma drástica, principalmente pelos milhares de casos em união estável hoje existentes, o casamento ainda é a via mais aprovada pela sociedade moderna e que garante às partes do matrimônio maior segurança para assuntos em geral, como financeiro, por exemplo.
Hoje, apesar de existente outra maneira de formalização do relacionamento, como no caso da união estável, a qual pode ser feita em cartório, esta não possui a mesma segurança jurídica que o casamento. Isto porque, a união estável, regularizada em cartório ou não, não garante a mesma segurança ao casal em termos patrimoniais que o casamento, principalmente pelo regime automático atrelado a tal união, que é o de separação total de bens. Prova disto está na própria Constituição Federal, ao dizer, em seu art. 226, § 3º, que é reconhecida a união estável como entidade familiar e que a sua conversão em casamento será facilitada, o que mostra que não é igualada.
O assunto envolvendo a proteção patrimonial pela união estável novamente veio à tona em 2015, quando a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, no caso de uma união estável que chega ao fim e que estava sob o regime de separação parcial de bens, a divisão daquilo que foi adquirido durante o relacionamento depende de a pessoa provar que as duas partes do casal contribuíram para obter o patrimônio
Apesar de tal decisão judicial, esta não possui efeito de lei e não pode ser utilizada como elemento norteador para tomada de decisões, dada a sua fragilidade. Não são raras as causas que começam em razão de um entendimento jurisprudencial e, pela morosidade do Poder Judiciário nacional, quando se encerra, os Tribunais já o alteraram, sendo a ação julgada improcedente.
Enquanto isso, no casamento, o nubente ingressa no relacionamento ciente de todos os seus direitos em caso de separação, o que diminui o risco de litígio futuro. Neste, o regime de separação de bens é obrigatoriamente exigido, ou seja, devem os nubentes, anteriormente à realização da cerimônia, optar pelos regimes hoje disponíveis no Código Civil.
Abaixo, para melhor compreensão, os regimes matrimoniais mais utilizados nos casamentos brasileiros, com uma breve descrição de cada um:
– Comunhão Parcial de Bens: Neste regime são arrolados os bens dos nubentes, anteriormente ao casamente, e classificam-se como bens comuns aqueles adquiridos/recebidos na constância do casamento, exceto os provenientes de doação ou sucessão, os adquiridos com o produto da venda de bens particulares ou sub-rogação, os bens de uso pessoal e os instrumentos de profissão. Os valores alimentares, tais como salário, pensões ou rendas semelhantes, também não são objetivo de partilha;
– Comunhão Universal de Bens: Neste regime, há de ser estipulado, em pacto antenupcial, a comunicação de todos os bens dos cônjuges. Neste regime não fica impedida a existência de bens unicamente de um dos cônjuges, porém, na transferência, doação ou outra operação que consolide a propriedade do bem, deverá constar cláusula de incomunicabilidade em relação ao outro cônjuge;
– Separação Total de Bens: Neste, novamente deverá haver um pacto antenupcial, que atribui individualidade a cada cônjuge na administração de seu próprio patrimônio. Os bens são todos, ou seja, os anteriores ao casamento, os presentes e futuros, bem como os seus frutos e rendimentos.
De todos os regimes hoje disponíveis no sistema legal pátrio, ainda o de separação total de bens parece ser o mais benéfico para os casos em que os nubentes ingressam no matrimônio com bens próprios e frutos de seus próprios esforços. Também, é uma forma de proteção para aqueles bens que possam vir a ingressar na gama patrimonial de cada um, e dos quais não se quer abrir mão em caso de divórcio ou separação.
A união estável, por outro lado, possui um caráter protetivo com menor alcance, pois não tem o condão de tocar os bens constituídos durante a sua constância, ao menos que as partes interessadas exijam, no momento da assinatura em cartório, a aplicação um regime de separação patrimonial mais rígido, o que muitas vezes acaba sendo mitigado no momento da celebração.
Mesmo que o momento da celebração da relação de amor firmada entre o casal não deva, em hipótese alguma, ser ignorada ou marginalizada, sendo preservado o caráter afetivo da ocasião e tudo que representa, o aspecto jurídico das relações regularizadas deve ser considerado. Jamais pode-se olvidar que o casamento é um contrato e, por isso, possui efeitos jurídicos para ambos os contratantes, bem como responsabilidades.
Considerando-se que, no momento de constituir matrimônio ou mesmo união estável, a paz é o que se pretende preservar naquele momento e no futuro, somente pode-se concluir que o pensamento preventivo é fundamental para cada caso, por justamente visar a minoração de dissabores e mesmo eliminar maiores riscos em casos de divórcio ou separação.
por Marcus Eduardo Von Mühlen
Advogado do escritório Renato Von Mühlen Advogados Associados
[1] Resolução n. 175, de 14 de maio de 2013, aprovada durante a 169ª Sessão Plenária do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
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