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MOTORISTA DO UBER É PROFISSIONAL AUTÔNOMO OU EMPREGADO?

MOTORISTA DO UBER É PROFISSIONAL AUTÔNOMO OU EMPREGADO?

Muito além da eterna guerra entre Uber versus Táxi, recentemente vem à tona a nova polêmica: motoristas do Uber de um lado e direitos trabalhistas de outro.

É curioso como a partir da popularização da internet o tempo cronológico passou a ter um significado diferente. Uma tendência, uma ideia e uma “verdade”, que eram absolutas na semana passada, já na segunda-feira caem em total esquecimento.

E assim vai acontecendo com nossas relações pessoais, sociais e, até mesmo profissionais: tudo é efêmero, tudo é fugas e o que era ontem já não é mais agora.

É uma era de insegurança emocional, ideológica e, também, financeira, o que de forma alguma agrada as pessoas. Porém, por assim ser, as pessoas acabam sendo forçadas a serem criativas, por simples necessidade ou por desespero mesmo!

Então, eis que surge uma grande oportunidade de negócios no mercado: as “caronas remuneradas” via intermediação de aplicativo de celular. Foi quando uma empresa multinacional norte-americana, de aclamado sucesso em mais de 70 países do mundo, resolve explorar o mercado brasileiro. Assim, em junho de 2014, a empresa Uber passa a operar no Rio de Janeiro, depois em São Paulo, e após, desenfreadamente por todo o Brasil. [1]

E embora tenha causado muitas controvérsias, tumultos e protestos, o Uber foi aos poucos se popularizando, ganhando espaço e passando, inclusive, a ser a opção preferida de deslocamento para muitas pessoas, até mesmo para as que possuem carro. De fato, são inegáveis a facilidade de uso do aplicativo, a rapidez com que chega o motorista e o baixo custo do serviço, se comparado a outras formas de transporte.

Também, para uma imensa parcela de trabalhadores desempregados, o Uber veio como grande salvação financeira, pois é um sistema que solicita o preenchimento de poucos requisitos para que o candidato possa se cadastrar, assim como o serviço a ser prestado é de baixa complexidade.

O Uber é uma plataforma online intermediadora de prestação de serviços que ao recrutar seus motoristas parceiros não lhes exige qualquer formação técnica ou experiência comprovada na função. Basta o condutor comprovar, minimamente, que é maior de 21 anos e que possui carteira de habilitação categoria B – com a observação de EAR (Exerce Atividade Remunerada). Também, o veículo a ser conduzido precisa ter sido fabricado ao menos em 2008, possuir quatro portas, ar-condicionado, capacidade de levar até cinco ocupantes e uma apólice de seguro do tipo APP (Acidentes Pessoais de Passageiros). Além da CNH, a Uber não pede nenhum outro documento pessoal, mas, é preciso entregar um Atestado de Antecedentes Criminais. [2]

Pois bem, sendo aprovado o cadastro do candidato, basta ele instalar o aplicativo do Uber para motorista, ter um GPS, que já pode sair fazendo as suas corridas.

Veja-se que a proposta do Uber é, tão somente, fazer a comunicação entre passageiro e motorista. E cobra um percentual do condutor parceiro para realizar esse serviço.

Porém, com o passar das semanas ou de poucos meses, o motorista – que no início estava tão entusiasmo com a possibilidade de obter a boa renda que o aplicativo parecia oferecer – talvez se frustre. E muitas são as razões para que isso ocorra: a preocupação de vir a receber pontuação baixa através da avaliação dos usuários e ser descadastrado (excluído) do sistema Uber; os gastos que precisa arcar com combustível e manutenção do veículo; a falta de segurança que o serviço prestado na rua normalmente proporciona (mais ainda quando se está no trânsito); a insegurança a qual o próprio aplicativo expõe o motorista (ao aceitar a corrida, o condutor não sabe se o destino será em local de alta criminalidade), dentre outros fatores.

É nesse momento que o motorista começa a refletir se o negócio realmente está valendo a pena. Afinal, será que é correto que ele tenha que arcar sozinho com todas as despesas decorrentes da prestação de serviços ou não seria a empresa Uber a responsável por tais pagamentos? Ou mais: será que o Uber não deveria assinar a carteira de trabalho destes motoristas, reconhecendo o vínculo de emprego e lhes pagar todos os direitos decorrentes desta relação?

Na verdade, ainda que o Uber adote procedimentos padrões com relação a todos motoristas, a resposta para essa reflexão não é simples e dependerá de cada situação em específico.

De toda sorte, garante-se que para o reconhecimento judicial do vínculo de emprego são indispensáveis o preenchimento dos seguintes requisitos: trabalho prestado por pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação.

É fácil de se compreender que trabalho prestado por pessoa física vale dizer que este deva ser realizado por um ser humano, por uma pessoa. Já a pessoalidade, significa que o trabalhador não poderá fazer-se substituir por outra pessoa para realizar as tarefas para as quais foi contratado. Ou seja, sendo personalíssima a prestação do serviço, a morte do trabalhador extingue, automaticamente, o contrato entre as partes, não sendo a obrigação transmitida aos herdeiros e sucessores do empregado.

Também, exige-se que o trabalho seja prestado de forma não eventual para que se caracterize a relação de emprego. Ocorre, que vigora no Direito do Trabalho o Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, a partir do qual o trabalho deve ser prestado de forma permanente, pois presume-se que é a partir da manutenção do emprego que a pessoa consegue prover sua subsistência. E para custear suas despesas, o empregado logicamente precisa que lhe paguem para que preste o trabalho. Assim, o recebimento de pagamento pelo trabalhador é o que define a existência de onerosidade no vínculo de emprego.

E, por fim, para que a relação de trabalho seja reconhecida como uma relação de emprego, é imprescindível que no serviço prestado haja subordinação. Esse é o grande elemento fático que definirá o vínculo de emprego, pois para que o prestador de serviços seja considerado empregado ele terá que se sujeitar às ordens que lhe são dadas sobre a realização da atividade. Ou seja, a vontade do trabalhador ficará inerte na relação, estando ele submetido a acatar apenas a vontade do tomador de seus serviços (empresa). Esta é a característica essencial que diferencia o trabalhador autônomo do empregado.

E analisando-se a situação do motorista do Uber, embora a situação deles apresente muitos elementos comuns aos do vínculo de emprego, o fato é que não existe o requisito essencial, que é a subordinação.

Ressalta-se que Uber é uma empresa que oferece serviços de intermediação entre motoristas e passageiros, do serviço de transporte de pessoas, através do uso de um aplicativo de celular. O Uber não é uma empresa que contrata motoristas. Não há análise de currículo, de habilidades ou graduações. Basta o candidato comprovar que preenche os requisitos mínimos para que seja possível desenvolver a prestação do serviço para que se torne um motorista do Uber.

Uma vez tendo sido cadastrando, não há qualquer obrigação quanto ao horário ou aos dias em que o motorista irá trabalhar. Assim, o motorista pode fazer uma viagem ao mês, ou ficar meses sem realizar qualquer corrida, pois de forma alguma será descadastrado do sistema. E essa autonomia de horários e de frequência na realização do serviço afasta totalmente o requisito da não eventualidade exigido para o reconhecimento do contrato de emprego.

Na verdade, a condição mínima para que o motorista seja mantido no Uber é a de que mantenha sua avaliação [3], igual ou acima de 4,6 para que o padrão de qualidade dos serviços seja mantido.

Ademais, há total liberdade para que o motorista parceiro possa não aceitar e cancelar viagens, assim como a relação existente entre o motorista parceiro e o Uber não possui exclusividade. Assim, os motoristas podem prestar o serviço de transporte individual de passageiros também por meio de outras plataformas, pois nenhuma represália sofrerá o condutor.

Portanto, resta muito clara a situação de autonomia do motorista, não havendo que se falar em relação de emprego.

Importante esclarecer, ainda, que para a caracterização do vínculo de emprego é imprescindível a presença de absolutamente todos os requisitos aqui mencionados. Na falta de qualquer um deles, a relação é de trabalho, mas não de emprego.

Por isso, o motorista do Uber é profissional autônomo e não empregado.

Aline Becker

Advogada do escritório Renato Von Mühlen Advogados Associados

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Criado por ALINE CEZAR BECKER
Aline é advogada, especialista em Direito do Trabalho. Graduou-se em Direito pela Universidade Ritter dos Reis (UNIRITTER). Especializou-se em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Fundação Escola de Magistratura do Trabalho do Rio Grande do Sul (FEMARGS), bem como cursou MBA em Processo Estratégico de Pessoas, no Centro Universitário Barão de Mauá e MBA em Contract Law, na Harvard University. É membra da Associação Gaúcha dos Advogados Trabalhistas (AGETRA) e constantemente participa de campanhas em defesa de direitos sociais.

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